Certamente, esta é uma das imagens mais fortes e chocantes (a carcaça de uma animal morto por motivos de seca e fome) de quem frequenta o sertão do nordeste brasileiro, em especial o sertão cearense. A segunda cena mais impactante é ver o agricultor familiar chorando ao ver esta cena.
Nada, simplesmente nada, justifica as duas cenas. Basta um olhar rápido em qualquer cidade em que se percebe estas duas cenas acontecendo para se notar que algo de muito errado acontece neste país a anos e, no final da cadeia social, quem sofre é a vaca morta e o agricultor: este algo chama-se desigualdade crônica e perversa.
Isto que digo parece discurso batido e piegas, mas não o é. No mesmo município em que o gado morre de fome e de sede e o agricultor é obrigado a beber água contaminada em virtude da "estiagem" dos recursos hídricos, é possível perceber que as elites locais não estão passando mal assim. Continuam andando em carros importados com ar-condicionado, com suas fazendas produtivas, fazendo algo mais doloroso para nossa sociedade: distribuindo favores, cesta básica, ração, dinheiro e outros presentes "em função da situação calamitosa que a natureza trouxe para todos nós".
Ora, se a seca é para todos, parece-me estranho que a natureza escolheu logo o agricultor para fazer dele seu principal afetado. Logo o agricultor que cuida mais da natureza, que vive dela, que possui uma relação de amor e ligação visceral com a mãe natureza. Como sou comunista e acredito que a natureza não seria tão injusta com aqueles que dela necessitam, eu acredito em outra teoria bem antiga: a seca flagela uns para dar lucro a outros.
As elites locais lucram política e economicamente com a estiagem. É fácil perceber, basta dar uma volta em qualquer interior (não vou nem citar o exemplo das cidades, pois isto daria outro artigo) do nordeste. Vende-se tudo a quem mais precisa nos momentos de calamidade: vende-se alimento "fiado" a preços maiores para que a dívida fique impagável, vende-se água contaminada, vendem-se poços profundos a preços exorbitantes, vendem-se favores e vende-se a dignidade do trabalhador rural. Basta procurar que rapidamente se saberá da máfia da benda de poços profundos protagonizada pelas elites que dominam prefeituras pelo sertão adentro. Ninguém investiga e nem isto vira notícia porque crimes da estiagem nao vendem jornais como vendem desvios da Petrobrás.
O governo que possui parcela grande da culpa (este é o termo mais adequado) deste processo, alega eternamente que está investindo para melhorar a situação. Mudou de discurso ao longo dos tempos. Parou de dizer "combate a seca" para "convivência com a seca". Eu pergunto: convivência de quem? de que? como?. Fiz uma busca rápida na internet e encontrei algumas matérias jornalística que afirmam que o estado do Ceará tem investido alguns milhões "nesta questão". Contudo, quando comparo este mesmos milhões com outros milhões de incentivos a indústrias oportunistas de estruturas pré-moldadas (tão fugazes quanto as chuvas), percebo quanta diferença de investimento de milhões existe na "estiagem de recursos" para investimentos. Concluo, então, que a conivência com estiagem nunca foi prioridade dos governos (no máximo hoje se gerencia tragédias e calamidades). Afinal a cerca (propriedade privada concentrada na mão de poucos) é lucrativa. A seca é muito mais.
Até quando ficaremos cantando a súplica cearense? Por mim, já podíamos deixar de cantar hoje.
Súplica Cearense
Gordurinha & Nelinho
Oh! Deus, perdoe este pobre coitado
Que de joelhos rezou um bocado
Pedindo pra chuva cair sem parar
Oh! Deus, será que o Senhor se zangou
E só por isso o sol se arretirou
Fazendo cair toda chuva que há
Senhor, eu pedi para o sol se esconder um tiquinho
Pedi pra chover, mas chover de mansinho
Pra ver se nascia uma planta no chão
Meu Deus, se eu não rezei direito o Senhor me perdoe,
Eu acho que a culpa foi
Desse pobre que nem sabe fazer oração
Meu Deus, perdoe eu encher os meus olhos de água
E ter-lhe pedido cheinho de mágoa
Pro sol inclemente se arretirar
Desculpe eu pedi a toda hora pra chegar o inverno
Desculpe eu pedir para acabar com o inferno
Que sempre queimou o meu Ceará
Gordurinha & Nelinho
Oh! Deus, perdoe este pobre coitado
Que de joelhos rezou um bocado
Pedindo pra chuva cair sem parar
Oh! Deus, será que o Senhor se zangou
E só por isso o sol se arretirou
Fazendo cair toda chuva que há
Senhor, eu pedi para o sol se esconder um tiquinho
Pedi pra chover, mas chover de mansinho
Pra ver se nascia uma planta no chão
Meu Deus, se eu não rezei direito o Senhor me perdoe,
Eu acho que a culpa foi
Desse pobre que nem sabe fazer oração
Meu Deus, perdoe eu encher os meus olhos de água
E ter-lhe pedido cheinho de mágoa
Pro sol inclemente se arretirar
Desculpe eu pedi a toda hora pra chegar o inverno
Desculpe eu pedir para acabar com o inferno
Que sempre queimou o meu Ceará
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